quarta-feira, 25 de julho de 2018

Os Pretos Velhos, Almas e Angola, Canjerê e Lunda Kioko

As almas santas e benditas. São a falange mais caracterizadora da Umbanda, e nasceu de cultos conhecidos como Almas e Angola e Lunda Kioko (Omolokô).

Foto: paijoaodeangola.com.br

Os primeiros negros que aportaram no Brasil, mais precisamente Rio de Janeiro, vieram da região da atual Angola, e do sul da África. Eram as tribos: Lundas, kiokos, cabulas, cambindas, haussás, fulanis, cassanjes, mucoca, monjolo, congos, bantos, Fashi-Ashantis, moçambiques.

Estes negros se uniram em crenças como todos nós sabemos e mais ou menos se unificaram no ritual de Angola (bantu-kikongo). Os mais sincretizados se transformaram nos rituais denominados ‘Almas e Angola’ e Omolokô (Lunda Kioko) que foi difundido no Rio de Janeiro e Minas Gerais.

A angola continuou com seus Ji’nkinsi (Deuses-plural de N’kinsi) cultuando-os em quase total segredo.

Algumas casas sincretizaram seus deuses aos deuses nigerianos sem poder ter ensinamentos suficientes ou mediante aos sincretismos particulares (filhos de uma nação se introduzindo e amalgamando as duas).

A nação Lunda Kioko (Omolokô) -era uma tribo ao sul da África- em boa parte sincretizou seus Kalundu aos orixás nagôs, e em boa parte foi se perdendo (até que se encontra atualmente numa busca por suas raízes em algumas casas)

A nação ‘Angola e Almas’ foi sincretizada ao catolicismo, e incorporou o panteão nagô. Posteriormente foi transformada em Canjerê e depois em Umbanda de Almas. Muito fácil ter se perdido suas raízes ou mesmo citações após tantas incorporações e desmembramentos.

O resumo acima nos permitiu entender melhor não só as raízes da linha das almas de Umbanda, como da própria Umbanda. E uma pergunta insiste: -Coincidência o Estado da Guanabara ser a capital do país e ter recebido os escravos bantos e congos? Seria talvez um plano dos espíritos superiores? Ou pura matemática, a Umbanda nascer na capital e se dar por tantos sincretismos onde justamente havia um fluxo grande de perspectivas religiosas? O que você me diz?

Podemos em Angola e Almas ancorar a base dos pretos velhos, que não foi totalmente perdida, pois estamos ainda em contato direto com os protagonistas. Mas aos que buscam entender a pureza do culto:

A maior parte dos rituais banto e congo não se dá pela incorporação, mas pelos encantamentos. 
As cantigas, ervas, favas, pós e os dikenga (mandalas utilizadas no Kongo), são os maiores fundamentos neste ritual (assim como no culto à Ifá). 

Os ancestrais deste culto sempre ficaram com o espaço externo denominado ‘Cruzambê’ (ver a iniciação de muzenza, Ornato José da Silva - Pallas), a casa das almas, com um cruzeiro, chão de areia, copos, ervas, favas, coités, e quartinha. Aprendi em algumas casas a colocar uma quartinha para as almas. Como bem vimos antes em relação aos nossos ancestrais familiares houve muita dispersão, mistificação, e com todas essas misturas muita coisa real foi perdida. Ou seja, o ritual que mais interessa é o que funciona para nós e este nem sempre é o que queremos.

Cada preto velho possui uma raiz, uma fé e culto segundo seu aprendizado.

Eu aconselho o conhecimento do médium para com seu guia, e através deste conhecimento desenvolver seus rituais.

Uma imantação de um Preto Velho é maravilhosa para proteger uma casa, e os resultados são sempre obtidos.

Normalmente usamos para a imantação dos pretos velhos:


  • O ponto em ferro, madeira, ou pemba.
  • Uma panela de ferro
  • Otá 
  • Os sete metais (ouro, cobre, prata, chumbo, estanho, latão e ferro)
  • Sal grosso (de preferência o puro)
  • Folhas de café, tabaco, fumo e arruda.
  • Favas de saúde, sete linhas, paz, divina, olho de boi, preto velho.
  • Turmalina negra (Puxa toda a negatividade)
  • Uma estrela de cinco pontas (Símbolo de vida, evolução e Umbanda)
  • Uma cabeça de alho roxo (afasta vampiros e parasitas astrais)
  • Um punhal preto e branco (Ponteiro serve para impedir a passagem de espíritos indesejados, deve ficar por cima apontando para a entrada, ou virado para cima)
  • Orobô (pacto com a ancestralidade)


Deixar os elementos curtindo no sumo das ervas  preparado com vinho com orobô ralado por três dias.

Depois colocar na panela de ferro com sal grosso, o ferro, e os outros elementos, soprando o pó do ponto por cima.

Plantar num pé de arruda, sem o sal grosso, colocando num vaso de planta na porta de casa, no quintal ou varanda.

Colocar os elementos num coité com sal grosso na frente da imagem.

Caso não tenha assentamento no seu ritual: Lavar a imagem com as ervas e essências, e colocar os elementos nos pés da imagem, ou dentro. Neste caso o otá deve ficar em contato com a terra numa planta, não é bom ficar preso dentro da imagem.

Colocar tudo numa quartinha (menos o sal grosso) e oferecer à entidade com água ou sumo de ervas aos sábados. As bebidas alcoólicas e café colocar num coité.


Outros elementos que podem fazer parte da sua firmeza:
Um imã com muitas moedas
Cruz de osso ou marfim (vendida em lojas de artigos religiosas)
Cruz de Azeviche
Figa de Azeviche
Figa de Arruda
Figa de Guiné
Terço
Pedra Dara


O colar tradicional sempre foi a conta de lágrima de nossa senhora, eu conselho um olho de boi, favas, pedras, e se possível pingentes feitos com os metais astrais, ou no mínimo o chumbo que nos liga à ancestralidade e o carma, e o ouro que nos remete à saúde (saúde, poder, riqueza).

A melhor oferenda é o prato tradicional para a raiz desta entidade. Pai mineiro com um feijão e couve, Maria Baiana com um angu...Tia Maria de Minas um Tutu, o que melhor for de agrado aos nossos protetores. A diferença são os elementos que  colocamos na oferenda simbolizando o que nós estamos pedindo materialmente, emocionalmente, e mentalmente.
Para muitos isto pode ser indiferente, mas aos que entendem sobre psicologia, subconsciente e egrégora de ancestrais culturais poderão se utilizar de magias aprimoradas.


MAGIAS E RITUAIS DAS ALMAS

Defumador para afastar descarrego e mandar energias negativas, feitiços e espíritos mal intencionados - fazer num dia de sábado
Palha de alho
Cominho

Magia para atrair positividade, boa sorte e prosperidade pelas almas 
Quinar as folhas de guiné, cana-de-açúcar, sálvia e Alfavaca e depois fazer um chá.
Colocar o chá ainda bem quente numa tigela na entrada da casa, com a porta aberta, enquanto sobe o vapor do chá, assoprar pó de açafrão de fora para dentro, cantando a cantiga do seu preto velho ou preta velha, depois lavar a entrada da casa, e salpicar por dentro e por sobre o telhado.

Oferenda para atrair toda a positividade do seu preto velho (preta velha) na sua vida
Fazer um chá de cominho, dente de alho roxo e arruda. Com este chá fazer um mingau de aveia, colocar numa folha de mamona roxa, arrumar frutas brancas que você goste por cima. Enfeitar com galhos de arruda e flores brancas. No caso de oferenda a uma preta velha colocar um ovo de galinha caipira no meio (simbolizando a fertilidade feminina).

Magia para atrair dinheiro pelas almas
No cachimbo do seu preto velho (ou preta velha) colocar o fumo e misturar anis estrelado, canela e sálvia. Ir fumando e fazendo seus pedidos e sua oração de preferência. Passar oito moedas pelo corpo, colocar aos pés da imagem ou imantação prometendo depois levá-las à porta de uma igreja.

Magia para segurança no comércio
Uma figa de madeira, grande e virgem. Quinar arruda e acrescentar um chá de cominho deixar por três dias curtindo. Depois de 3 dias, socar três dentes de alho e esfregar na figa com dendê. Riscar o ponto do seu preto velho e soprar sobre a figa. Amarrar a figa com fitas do Sr. do Bonfim e outros santos de sua devoção. Colocar no comércio.Não é indicado para bares, pois este amuleto repele egun, o que destruiria o movimento de um bar.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Uma breve Homenagem ao Sr. Chico Preto

Raras são as informações que se obtém dele, o nome desse blog foi justamente em homenagem a esse grande Pai, a esse grande Espírito do qual o Cosmico me presenteou, é um amigo, um pai, um irmão, um protetor, um verdadeiro mestre da Escola da Vida.
Eu me lembro como se fosse ontem a sua primeira aparição… Era uma gira de baianos, onde em minha mente, plasmou-se uma entidade como se fosse um roceiro, o mais interessante, foi que eu o vi em uma árvore, em um local que parecia uma chácara, uma fazenda, estava ali, um belo senhor simpático, chapéu diferenciado, não era bem de palha, um material diferenciado, calças dobradas e uma camiseta amarela.
O que mais me chamou a atenção foi o tamanho do seu cachimbo, é um cachimbo muito grande e feito artesanalmente, o cabo de madeira e onde guardamos o fumo, material de barro, feito também artesanalmente.
Em questão de segundos fui influenciado pela sua vibração, uma vibração extremamente sutil, diferenciada da vibração de baianos que eu já estava habituado, lentamente foi tomando conta dos meus sentidos e quando dei por mim, já estava com a visão meia turva, falando diferente com um sotaque extremamente mineiro, muito simpático e alegre.
Mas veio, falou muito pouco, talvez por não estar habituado com a minha energia, não tenha incorporado de uma forma tão completa, mas ele solicitou o cachimbo, da forma que eu havia visto e disse apenas que o nome dele era “Amor” e que trabalhava na falange da “Caridade”, talvez para me ensinar que nome não é tudo, porque é a primeira coisa que eu quero saber de uma entidade é o nome, para eu correr atrás das pesquisas.
Após algumas semanas de trabalho, ele foi moldando-se mais à minha energia e foi trabalhando da forma que ele realmente atuava, já com o seu cachimbo, e diga-se de passagem, me deu a maior vontade de entrar do nada em uma casa do norte e acabei achando logo os dois juntos, o cachimbo e o seu chapéu, achei uma bênção. Mais solto, mais desenvolto em minha matéria e com o axé da casa, entoou um ponto assim:
Eu vim de Minas
Mas Nasci no Piauí
Saravá Sr. Chico Preto
O que vem fazer aqui?
Confesso que eu estava “assistindo” de uma visão pouco privilegiada o seu trabalho, mesmo assim, me encantei na primeira vez que o vi.
Com o passar do tempo, após alguma labuta e nenhuma informação eu obtive, em um dos trabalhos ele trouxe mais alguns pontos:
Sr. Chico Preto, Chico Preto Tenha dó (bis)
Venha cá salvar seus filhos
Tu é mestre do Catimbó
Todo mundo quer, quer, quer, quer
Chico Preto quimbandeiro lá do povo da Guiné
Lá na Jurema teve um fuá
Levaram o Milharal
Quem levou foi Chico Preto
Pra levar todos os Mal
Aí fui me apaixonando, pelo seu sotaque, pela sua alegria, pela forma que conduzia os trabalhos, um carisma singular, e com isso, foi atraindo a atenção dos filhos da corrente e dos assistentes que ali adentravam.
Aí veio um outro grande problema: Ele pediu uma batida de milho, mais uma vez, corri atrás de algo bem peculiar de seu trabalho,  a facilidade que eu tive pra achar seu cachimbo se inverteu, mas procurando, procurando, achei uma casa do norte que vendia batida de milho, e logo comprei.
Mesmo não sabendo nada sobre Chico Preto, comecei a procurar a pesquisar o catimbó e em alguns fóruns, conheci a Aparecida, uma mulher de 52 anos que já conhecia o catimbó desde os 10, e começou a me falar muito de Chico Preto, inclusive, do uso de cachimbos artesanais no culto à Jurema, vulgo Catimbó, onde a fumaça é a principal fonte de trabalho do catimbó devido às raízes da pajelança. Vi que a forma que eles trabalham, não condizia muito com a minha crença esotérica na Umbanda, atuavam também sobre uma camada de trabalho mais densa.
Aí foi quando comecei a me perguntar em meu limitado conhecimento: Como um adepto à Umbanda Esotérica, pode começar a vibrar com uma energia mais densa? Um guia de catimbó na minha corrente umbandista sendo que eu nem sei o que é isso? Por que comigo?
Para responder calmamente a essas perguntas, como é de sua característica, a calma e o humor são ímpares nessa entidade, ele me explicou que primeiramente, não há ninguém tão ignorante que não tenha o que ensinar e nem tão sábio que não tenha o que aprender, com a permissão de minhas entidades, ele “enconstou” para contribuir com o meu crescimento e aprender algumas coisas que ocorriam ali dentro do casuá. Depois, ele me perguntou: Quem te disse que só atuo no catimbó? Que sou apenas um juremeiro? Eu trouxe essa força, primeiro para contribuir com a casa, segundo para que você aprenda a ser menos preconceituoso.
De qualquer forma fiquei muito alegre com sua chegada, ele é um guia que canta muito, faz todo mundo cantar com ele, é um ser extremamente dócil e humilde, abraça a todos, conversa com todos, sabe fazer as pessoas que chegam até ele se sentirem muito à vontade.
Como de costume, antes de me deitar realizo todo um ritual de limpeza, energizando uma grande luz branca pousando sobre meu coronário, atuando nos meus sete chakras principais e depois toda as más energias repousam sobre a Terra, sendo absorvidas pela vibração de Obaluaie, nesse dia, havia algo muito estranho, comecei a sentir um calor no corpo e me apareceu um mentor muito bem vestido e de muita luz, causando um calor intenso sobre meu cardíaco e plexo solar, com  aparição desse mentor de luz, me começou a vir várias impressões, ensinamentos, entre outras soluções para minhas dúvidas, o mentor estava vestido com roupas orientais, grande quantidade de panos sobre suas vestes, mas como é inerente a mim, questionei o seu nome, ele com um sorriso que logo reconheci, disse: Pode me chamar de Chico Preto.
Com isso, uma outra resposta me veio de imediato, quando venho como um mineiro faceiro, venho de forma humilde, para todos aqueles humildes de coração, com carência de conhecimento, não sintam-se diminuídos a chegarem a mim, não venho para doutores e letrados, venho apenas para aqueles aflitos que buscam na simplicidade da palavra, sua salvação, para aqueles que buscam entre seus semelhantes, ou seja, o sotaque, o fumo, a bebida, buscam um amigo.
E assim solucionei a minha dúvida sobre um guia de catimbó ter encostado, o que eu entendi é que talvez tenha escolhido essa forma de trabalho, primeiro para eu conhecer mais o culto ao catimbó, segundo para que pudesse me ensinar que os guias podem plasmar-se e diminuir sua vibração para atuar em seu orbe, e ele acrescentou: Já fui sim uma pessoa simples que viveu no que vocês chamam de roça, já nasci e me criei por essas Terras e agora escolhi vim de uma forma semelhante para atuar também na Umbanda, que é um Grande Pronto Socorro Celestial.
Aprendi que nem todos os guias que optaram por trabalhar em uma vibração mais densa são espíritos atrasados, mas podem ser espíritos de grande evolução que por sua humildade, também auxiliam os irmãos mais atrasados. E gostaria de salientar que esse Chico Preto foi o que praticamente assumiu todos os trabalhos de consulta e que conduz a gira quando o sacerdote da casa está desincorporado. Chamou a responsabilidade pra ele e graças a Deus tem dado conta.
Como ele mesmo diz: Sem alegria nada se faz, sem sorriso nada se conquista, vamos cantar, vamos sorrir, aqui dentro quero farra, quero ver felicidade.
Saravá Sr. Chico Preto
Salve os Mistérios Umbandistas
Salve os Grandes Mestres Cósmicos 

quinta-feira, 12 de julho de 2018

História de Pai João

 “Saiba, ó filho meu…
Que existiu uma época muito distante, em que o calendário não registrou nos anais da história da terra, um povo entre as diversas raças humanas que passaram, como estrelas espalhadas no firmamento, sábio e culto, filosófico e sonhador…
Sonhavam em retornar ao seu lar sidério, situado entre as estrelas da constelação do Cocheiro…
e por isso, os mais dotados espiritualmente, insistiam em olhar o céu e suspiravam de saudade…
A lua com seu raio argênteo, espraiava-se sobre as encostas setentrionais daquela região onde hoje se encontra Madagascar, há muitos e milhares de anos…
O homem sagrado bordejava a orla do mar, e em seu caminhar contemplava a imensidão dos astros notívagos e suspirava com seu olhar marejado, as constelações como se quisesse ler no misterioso livro do céu o futuro de seu povo…
Alto e esguio, de compleição delicada, olhos brilhantes e profundos, Nalmyskar, o sacerdote do templo de Obhaluayê perscrutava as conjunções do céu para compreender os vaticínios que chegaram através de seus sonhos, com relação aos acontecimentos prestes á desabar sobre seu país…
Com seu cajado na mão direita, permanecia de pé ao som do mar e á luz dos espaços infinitos, e assim permaneceu por longas horas, em contemplação silenciosa…
Revia o sonho e cada parte triste…o povo inteiro seria colocado á prova por desprezar a grande lei de zambi! E agora os Araxás através de seus sonhos anunciavam a grande tragédia que se abateria sobre todos como remissão dos pecados…
A sabedoria milenar há muito fora deturpada por sacerdotes corrompidos, que se deixaram levar pelos ouropéis e vaidades humanas, patrocinando verdadeiras orgias, descambando para a magia negra…
Triste sina de um povo que já foi a aurora de uma civilização grandiosa!
Muitos serão banidos, degredados, irão para longe de seus lares, como escravos de uma raça que não tardaria em surgir no horizonte, em busca de conquista e ouro.
Famílias inteiras separadas, genocídio, depravação e miséria seria o castigo deste povo orgulhoso e vingativo que ousou contrariar as leis sagradas dos Araxás…a sagrada lei de zambi!
Os grandes e brilhantes olhos do sacerdote derramavam copiosas lágrimas, vertidas de seu coração sincero, pois guardava as leis sagradas e vivia de acordo com os mais altos ensinamentos de sua escola de iniciação. Sabia que voltaria para seu lar sidério, para a sua amada estrela situada na constelação do Cocheiro, mas e o seu povo? Voltaria á vê-los? Aqueles que ficavam, que atraíram para si os olhos enérgicos dos Araxás?
Enquanto assim permanecia, não percebeu sublime Entidade postada á seu lado, que lhe observava com profundo amor e carinho.
Uma brisa fresca roçou seu rosto magro e escuro como ébano, e uma voz se fez ouvir, como que vinda da distância que ele mesmo contemplava da sua saudosa estrela…
“…Nalmyskar! o grande Zambi te abençoa através dos sagrados Araxás!
Trago-te a promessa de que, tão logo seu povo sinta o braço pesado e longo do carma, você retornará para cumprir missão junto aos teus mais caros afetos!
Numa terra que ainda está por ser descoberta, muito além mar, tu irás voltar para o seio do povo que tanto amas, e assim auxiliá-lo na difícil missão de retornarem aos braços de Zambi, através da dor e do sofrimento. Os Grande Senhores da Aumbhandhã, os Mestres da Luz Primaz ouviram tuas preces, abençoado sacerdote, pois que tu guardaste a lei de Zambi em seu coração!
Retornarás  como Guia de uma futura religião que está para nascer nas terras do Cruzeiro do Sul,e inspirarás com teu exemplo de humildade os teus filhos deserdados…
Serás conhecido como Pai João do Congo por muitas gerações que te sucederão ao longo da jornada que ora se inicia em tua experiência íntima, e terás a alegria de ver voltar ao aprisco do amor de Zambi muitos de teus filhos desgarrados, que com teu amor, com tua dedicação e humildade irás inspirar aos dias melhores no futuro…
Por agora descansa, prepara teu espírito para as horas amargas que se abaterão, logo que a lua mude seu ciclo, para alertar mais uma  vez teu povo das severas lições que lhe aguardam! Paz e Luz, Nalmyskar, abençoado dos Araxás!”
Com os olhos marejados, e profundamente emocionado, o velho sacerdote retornou a passos lentos em direção de sua aldeia, enquanto a lua, em seu zênite parecia compartilhar com a tristeza do velho ancião…
  (João B.G.Fernandes)

Vovó Benta

Breve História de Vovó Benta
Negra esbelta, de sorriso sorrateiro e conquistador, de requebrado insinuante, andava pelo casarão deixando no ar o cheiro do manjericão. Cantarolando, sempre faceira atiçava o desejo, nos negros e também nos brancos. Não passou despercebida do olhar do patrão, sinhozinho cujos dotes de beleza também assanhavam aquela negrinha. E assim, depois de uma primeira vez, foi inevitável que todas as noites ele a procurasse na senzala. Não era só um desejo, mas além do corpo que ardia ao vê-la, seu coração estava emaranhado num sentimento ao qual ele negava.
Foram anos de encontros furtivos, aos quais a sinhazinha fingia não ver. E muitos abortos, num dos quais a negrinha desencarnou.
Haveria de renascer em muito pouco tempo no mesmo lugar. Negrinha doente, que sobreviveu à morte da mãe no parto. Muito cedo aprendeu a benzer e ali estava uma negra curandeira. Parteira requisitada, não tinha hora para atender, até o dia em que, para salvar uma escrava das mãos do feitor, levou uma paulada nas costas e aleijou. Andou o resto de sua vida agachada e com fortes dores, mas nem por isso deixava de salvar vidas. Desencarnou cega e arqueada, porém feliz.
Mas havia muito a ressarcir na contabilidade do céu. Por isso, juntou-se às bandas de Aruanda e como preta velha desce à crosta para ajudar a curar e aconselhar. Precisou de um aparelho cujo comprometimento fosse adequado às suas energias, para que juntas possam aprender que é curando as feridas alheias, que as nossas cicatrizam.
De galho verde na mão e muito amor no coração, Vó Benta visita seu aparelhinho, baixando-lhe as costas e transferindo um pouco da dor que sentiu na carne para que este saiba que a humildade se faz necessária. Seu alvo avental, ao final do trabalho está sempre cheio de nós, que ela faz, para desfazer aqueles que os filhos de fé trazem até ali. No final da noite, junta-se aos irmãos e volta para Aruanda, até que a próxima lua a traga novamente cantando:
 Vem chegando Vovó Benta**
Benzedeira de Aruanda
Com seu galhinho de Arruda
Vem benzer filho de Umbanda….
* Leni Winck Saviscki, autora dos causos que compõem este capítulo, médium que manifesta o espírito que se apresenta como Vovó Benta – Benfeitora Espiritual** que atua na linha dos Pretos  Velhos